PRIMEIRO DE ABRIL
Escrito em 05/03/2019.
Primeiro de abril, além de aniversário de uma pessoa muito importante[1], como todos sabem é também o Dia da Mentira.
Se você pensa que as pegadinhas de primeiro de abril são uma coisa brasileira, saiba que a data é “comemorada” em vários países. Nos de língua inglesa a data é conhecida como “Dia dos Bobos” (April Fools’ Day); na Itália e na França, não me pergunte por quê, é o “Peixe de Abril” (pesce d’aprile e poisson d’avril, respectivamente).
Dia da Mentira, convenhamos, é um nome bem mais simpático. Uma mentirinha de vez em quando é quase que obrigatória. O Professor Ariano Suassuna, com toda a autoridade, ensinou que sinceridade excessiva pode ser algo muito constrangedor.
Duas das maiores e mais bem sucedidas bandas de que já se teve notícia são de mentira, nunca existiram.
O disco da Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, uma banda imaginária, vendeu mais de 30 milhões de cópias.
Desconhecida (até porque não existia), logo na primeira faixa do disco a banda precisou se apresentar: “We’re Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band, we hope you will enjoy the show….”[2] [3]
A banda era fictícia, mas o disco foi uma revolução bem real em todos os aspectos: as inusitadas técnicas de gravação; o conceito de “álbum” (foi o primeiro a trazer as letras de todas as músicas); a capa histórica com retratos de 59 personalidades (dentre elas: O Gordo e o Magro, Freud, Jung, Marlene Dietrich, Marilyn Monroe, Fred Astaire, Bob Dylan, Marlon Brando, Albert Einstein, os Beatles!). E acima de tudo, claro, as músicas.
O disco foi lançado em 1967. No ano anterior os Beatles, estressadíssimos, haviam decidido que não fariam mais shows. Depois da última turnê tiraram longas férias e retornaram com a ideia de usar um alter ego (a banda imaginária do Sargento Pimenta) para ter a liberdade de gravar um disco com músicas impossíveis de serem tocadas ao vivo.
E assim surgiu o disco que em 2003 foi considerado pela revista Roling Stone o primeiro entre os 500 mais importantes de todos os tempos.
Existem milhares de artigos, livros, teses e trabalhos acadêmicos sobre o Sgt. Pepper’s, mas o que me motivou a falar disto foi mesmo o fato de a banda ser de mentirinha.
Como são de mentira, também, os Sultans of Swing – nome da banda fictícia e da música que mostrou para o mundo o melhor grupo de rock de sua época, o Dire Straits[4].
A música, com uma guitarra tocada pelo inigualável Mark Knopfler de um jeito até então inusitado para o grande público (sem palheta), marcou tanto o grupo que era comum referir-se ao Dire Straits como sendo eles próprios “Os Sultões do Swing”. O que é um tanto quanto ilógico, já que o Sultans of Swing descrito na música é um conjunto amador de Jazz, com trompetes e tudo o mais, para o qual ninguém dá a mínima.
Quem disse que não existe mentira boa? Sgt. Pepper’s e Sultans of Swing, duas mentiras, marcaram minha vida (e a de muita gente) de uma forma extremamente positiva.
Mentirinhas inocentes, como as de Primeiro de Abril, não fazem mal a ninguém. Feia, imperdoável, é a mentira que fere, que magoa e prejudica o outro.
Que o diga Benito di Paula, arrasado ao descobrir que sua cabrocha mentia[5].
Primeiro P.S.:
Ele tinha ou não tinha razão?[6]
Segundo P.S.:
Como eu disse, com o Sgt. Pepper’s a intenção dos Beatles era fazer um disco com músicas impossíveis de tocar ao vivo. Parece que não deu muito certo…
[1] Oswaldo A. Pantoja, 01/04/1940.
[2] “Somos a Banda do Clube dos Corações Solitários do Sargento Pimenta, esperamos que você curta o show.”
[3] The Beatles, “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” (John Lennon, Paul McCartney) in “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”, 1967.
[4] Dire Straits, “Sultans of Swing” (Mark Knopfler) in “Dire Straits”, 1978.
[5] Benito di Paula, “Retalhos de Cetim” (Benito di Paula) in “Perfil Benito Di Paula” (coletânea), 2002.
[6] Ariano Vilar Suassuna (1927 – 2014) foi um dramaturgo, romancista, ensaísta, poeta e professor brasileiro, autor das obras Auto da Compadecida e O Romance d’A Pedra do Reino e o Príncipe do Sangue do Vai-e-Volta, foi um preeminente defensor da cultura do Nordeste do Brasil. (Wikipédia)
Só Música Boa !!! Que Maravilha Recordar estes Sucessos que fazem tão Bem para a Alma.
Agora meu Amigo !!! Retalhos de Cetim com Benito Di Paula é D+…Que Saudades…Tempos Maravilhosos foram Recordados !!! Muito Obrigado.
Adorei a estória do Sgt Pepper. Ainda tenho o “bolachão” do álbum mais “esquisito” e genial dos Beatles. Bem legal falar do dia da mentira. Talvez devesse ser criado ou celebrado o Dia da Verdade. Seria o dia em que nada se falaria. Já que as verdades que temos só podem ser convictas de serem convictas mas não de serem verdade. Ainda mais porque a Verdade não pode ser dita pela própria falta de alcance da linguagem. Seria o dia do silêncio. Acho que já existe; mas com o sentido de falta de ruído e não como manifestação da verdade.
Mas ainda há uma esperança. Ontem (02 de Abril), ironicamente logo após o dia da mentira, foi o dia de conscientização sobre o autismo. Não pude evitar. Fazer um paralelo. A pessoa com o espectro de comportamento autista jamais vai dizer para vc que gostou do presente que você deu só para agradá-lo. Ou que gosta de vc se não gostar. Jamais vai dizer “não foi nada” quando você pisar no pé dela e perguntar “Me desculpe, machucou? Doeu?” Ela vai simplesmente responder “Doeu”. E voltará ao que estava fazendo. Sem saldo devedor. Elas não negociam com a “mente/ira.”. São bem autênticas. Mas vamos ao que é importante. Quando estive na Itália fui perguntar sobre o “Peixe de Abril”, o “Pesce D’Aprile” para a pessoa mais entendida em cultura popular de qualquer país do mundo: o motorista de táxi. (Rsrsrsrs) Perguntei o que tinha a ver com o peixe (sem fazer trocadilhos). Ele ficou meio assim e me disse que era provavelmente porque os pescadores são mentirosos e sempre falam que o peixe “ERA DAQUELE TAMANHO!”
Saí do táxi satisfeito, mas assim que fechei a porta do carro pensei… será que ele mentiu? 😜.
Grande abraço.
Tanto faz a banda verdadeira ou a falsa, Beatles é a melhor banda que o planeta produziu. Agora as mentirinhas inocentes, mentiras piedosas, fazem parte da arte de viver. Impossível para os sapiens adultos e para os velhos sapiens não precisarem da mentira para não ofender, não magoar desnecessariamente. A mentira ruim, dolorida, traiçoeira que o Benito chora na sua linda composição, não é a mentirinha do primeiro de abril, mas é a mentira dos outros dias do ano. Já o grande Suassuna não gostava de magoar ninguém, falar mal deve ser pelas costas, concordo totalmente.
Mais uma crônica, agora o aniversário, do amor de nossas vidas, do dia da mentira, que se brincava tanto , era só alegria, saudades.
Parabéns pelas escolhas das músicas,quanta sensibilidade e sabedoria.bjos.
A cada “TEM MUSICA PRA TUDO” admiro o seu conhecimento musical ele nos dá a oportunidade de aprender.
Parabéns!
Quanto ao dia da mentira nos leva a saudades da infância era muito esperado para ver se iremos convencer com a nossa mentira.
Lembre-se saudades é o amor que permanece em nosso coração.
Quando criança, o dia da mentira era o máximo!!! Estávamos autorizados, por direito, a contar umas mentirinhas…
Tudo era muito pueril… Divertido!
Hoje, não mais…
Belo texto!!! Como sempre, verdadeiramente dito!!!
Adorei ouvir o Benito!!!
E o Grande Suassuna!!!
E todas as músicas…
Parabéns!!!
Você é o Máximo!!!
E hoje é dia 31/03!
O que não é mentira é sua profundidade nas abordagens.
Muito legal, de verdade!
Bj
Puxa vida,que coincidência!!Hj fui assistir a encantadora apresentação da Orquestra do Sargento Pimenta,da série Aprendiz de Maestro,uma homenagem aos Beatles e ao disco Sgt.Pepper’s.E a sala SP inteira tanto crianças como seus pais cantando ao vivo e bem alto Sgt.Peppers lovely Hearts club band.,é os Beatles estavam enganados………